Nunca soube exactamente que fenómeno me levou a repetir esta frase de ano para ano, na altura em que a estação das flores e dos amores dá lugar à dos gelados e sapatos cheios de areia. O que é certo é que o prognóstico sempre veio, mas nunca aliado a questões como o calor abrasador, o ar pesado, difícil de respirar, que nos faz dar voltas e voltas na cama sem conseguir adormecer. Esse vinha sempre dias depois, como que para confirmar o meu vaticínio. Havia qualquer outra coisa, um outro sinal enviado pelo universo e captado pelas minhas antenas sensoriais.
Só o percebi este ano, quando, longe de casa, não encontrei Verão. As roupas decresceram, os gelados tornaram-se parte da dieta diária, mas ainda não conseguia dizer o nome dessa estranha estação. Às vezes, estamos tão perto das coisas e tão acostumados a elas que deixamos de as ver. Passam a ser objectos naturais, hábitos diários, produtos da nossa personalidade. É preciso sair dessa bolha e sentirmo-nos um pouco despidos, desprotegidos, para lhes dar a atenção e importância que outrora negligenciamos.
Quando voltei a casa depois de tantos meses fora, era um fim-de-tarde dourado e a minha avó estava no quintal a regar as plantas. Trazia um avental pendurado no pescoço, o rosto sereno, marca do cansaço de quem cumpre as tarefas diárias. A água saía a jorros pela mangueira e era imediatamente absorvida pela terra e laranjas caídas no chão. E aí escapou, sem que para isso eu tivesse de fazer qualquer esforço: “Chegou o Verão!”.
Afinal, tratava-se dessa massa fina que me entra pela janela todos os fins-de-tarde, arrastada por uma brisa abafada que se entranha nas cortinas e nos lençóis – o cheiro a laranjas e terra molhada, o cheiro do Verão.
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