21 setembro, 2009

Olho as paredes sem tecto e recorto corações de papel. Mais tarde farei com eles uma manta de retalhos para servir de telhado. Enquanto não chover, será suficiente.

17 setembro, 2009

Em frente ao rivoli, o rapaz estende-lhe a mão, puxa-a para ele, e murmura: "amo-te". A palavra faz-lhe cócegas nos ouvidos, percorre-lhe o corpo como um arrepio, e ressoa na sua mente. Nesse instante ica com a certeza de que esse momento nunca se apagará da sua memória: o cheiro dos legumes a ser cozinhados no andar de cima, o som de palmas no final de uma peça de teatro, e aquele olhar intenso e sincero, que só por si evoca uma quantidade de sentimentos que só os dois poderão experimentar. O mundo pára de girar, e todos se imobilizam enquanto a respiração acelera e o tum-tum do coração se faz ouvir mais alto. Os seus lábios unem-se então, num pacto eterno de amizade e cumplicidade, de carinho e aceitação.

Ao longe, uma rapariguinha rota e mal vestida olha-os. Tem os olhos marejados de lágrimas. As gentes que passam julgam tratar-se da dor de um amor passado, das feridas abertas que traz no peito. Nunca imaginam tratar-se apenas de duas gotas de alegria, por presenciar à sua frente um dos mais belos sentimentos do mundo. Por saber que esse homem lhe pega na mão com o cuidado que teria com uma boneca de porcelana. Por saber que essa mulher que ali está sorri finalmente, e é feliz.

07 setembro, 2009

Linguagem sms


Já de há algum tempo para cá que me apercebo de que consigo dizer menos coisas em certas sms do que noutras - e aqui refero-me apenas ao espaço de 1 sms mesmo.

Ora a principio pareceu-me que seria apenas uma ligeira impressão, mas com o tempo a ideia foi-se fortalecendo. Então pensei que se deveria ao facto de haver palavras maiores que outras, e que ocupam, portanto, mais espaço. Mas hoje chegou ao cúmulo. A mensagem era tão pequena comparativamente a outras, e já excedia os caracteres válidos! Decidi, portanto, investigar, e cheguei à fantástica conclusão de que há letras/simbolos que ocupam mais do que um caracter.

É o caso do nosso rico Ç, que ocupa, nada mais nada menos do que 93 caracteres!!! Isso mesmo, leram bem. Cada vez que escrevem um Ç perdem 93 caracteres de espaço na vossa mensagem. Ora como isto é um abuso, vejo-me agora a dizer sim à linguagem sms, e nunca mais na minha vida escrevo um Ç numa mensagem.
Faz a pergunta de novo, mas a resposta é a mesma: um silêncio entrecortado por uma respiração forte, ruidosa. Duas lágrimas caem por entre soluços descontrolados. O telefone continua preso na sua mão. "Desculpa." O céu abate-se sobre ela, como se a força da gravidade se tivesse finalmente imposto, e de repente o chão está mais perto que nunca. Pergunta-se se por algum milagre terá encolhido, qual Alice no País das Maravilhas. Mas o seu mundo de maravilhas não tem nada. Tudo se foi pela frincha da porta do quarto, esse lugar de sonhos onde tantas vezes se refugiara para se esconder da realidade, e que agora se tornara como uma prisão de arame farpado, rasgando-lhe a pele e prenetando o seu íntimo. Porquê. Seria a pergunta correcta a fazer - porquê a mim, porquê agora, por que motivo. Mas a única coisa que pensa é quando. Quando irão as feridas fazer crosta, deixando para trás apenas uma pequena marca da sua existência? Quando irá recordar-se daquele momento com a nostalgia que nos traz lembrarmo-nos do passado? Quando irá voltar a sorrir ao mundo? E de repente a resposta impõe-se, fria e implacável: nunca.

03 setembro, 2009



Sonho que esse momento se prolonga pelo eterno. Estáticos, continuamos essa valsa de sentidos que nos entontece docemente. Não há tempo ou espaço, não há som ou silêncio. Há somente um bater contínuo e longínquo, e um calorzinho proveniente do bombear do sangue. Os nossos corações batem assim em uníssono, marcando o compasso de uma melodia que só nós conseguimos escutar, e que nos faz dançar assim, eternamente.

01 setembro, 2009

O jogo da vida

Perder ou ganhar. É esse o resultado de qualquer jogo que existe, seja ele o pedra papel tesoura, o monopólio ou o Euromilhões. A vida, como jogo constante que é, não é excepção. Uma vez ganhamos, outras perdemos. Estranha é a forma como tudo isto se processa, numa encruzilhada de voltas e reviravoltas dificeis de compreender.

Ao contrário de uma partida de poker em que todas as cartas estão na nossa mão, o destino guarda trunfos escondidos que não prevemos e que alteram completamente o nosso passado, presente e futuro. Passado, pois muitas vezes nos leva a encarar uma recordação de maneira diferente. Futuro, ao dar-nos novas cartas para a próxima jogada.

O problema é que na vida não há regras. Cada qual define os seus objectivos, os seus obstáculos e limitações; joga as suas cartas ou lança os seus dados à sua própria maneira. O entendimento é assim impossível neste campo - a resposta não responde à pergunta e a pergunta nunca esperou qualquer resposta. É por isso que nos impomos, que criamos regras e leis que partilhamos entre nós, na esperança de criar um cinto de segurança contra o destino. Mas de que nos adianta um cinto de segurança quando o nosso carro está prestes a ser engolido por um furacão?

Há no entanto certas pessoas que estão em sintonia. São essas as pessoas que procuramos durante toda a nossa vida, as ditas almas gémeas que raramente nos aparecem. E a bolinha continua a rolar sobre o tabuleiro vermelho e preto, à espera de calhar na casa certa. Será justo esperarmos sempre que essa seja a nossa casa? Será certo que hajam sempre vencedores e vencidos? A verdade é que a justiça do mundo é muito simples: quando nos dá uma coisa, tira-nos outra, para dar a outra pessoa.

Foi isso que se passou comigo. Vivi uma época de sorte, em que o meu jogo corria sempre bem e o que ganhava compensava sempre o que perdia. Mas chega sempre o dia em que o vencedor cai do pódio. Um passo do destino que mudou toda a minha vida. Recuperei quinze anos em quatro dias. Perdi quatro anos numa semana.

Perdi. Ganhei. No fundo sou apenas mais uma vítima dessa grande sala com sofás vermelhos e mesas forradas com pano verde, onde as fichas de jogo são os nossos sentimentos e atitudes, e onde as apostas não param, fça calor ou faça frio, seja noite ou seja dia. Sou apenas uma vítima da vida.