22 julho, 2011

Prisão

Uma nuvem de lágrimas abateu-se sobre a cidade, projectando sombras de bocas abertas derramando gritos mudos de terror. Mãos desesperadas atiram-se para fora dos postigos, das janelas, das frinchas das portas, tentando desesperadamente agarrar as roupas dos que passam. As suas unhas cravam-se no solo e arrancam pedras da calçada e raízes, dolorosa sinfonia que arranha os ouvidos dos que passam. Clamam por atenção, suplicam para que os olhem. Mas os de fora nem os notam. Deambulam sem destino,  ofuscados pelas imagens coloridas que se estendem sobre as habitações - imagens de raparigas jovens com roupas sofisticadas e óculos de sol em praias exóticas. São marcas de um passado que já não existe, mas que insiste em impor-se todos os dias, com um sorriso trocista, perverso, atirando-se para os transeuntes, derrubando-os sem clemência. Os outros, os que escapam, procuram no céu algum conforto, esperança última de salvação. Mas enchem-se os seus olhos de terror quando, virados para cima, descobrem esse azul eterno mutilado por arranha-céus gigantes, as grades dessa prisão.