26 outubro, 2010

Night on Earth

Já alguma vez se questionaram no que estarão a fazer outras pessoas no exacto momento em que estão a fazer alguma coisa? É disso que trata este filme: um mesmo momento, uma mesma acção, cidades diferentes. Uma viagem de taxi nunca é a mesma, principalmente se a "corrida" tiver lugar em sítios como Los Angeles, Nova Iorque, Paris, Roma ou Helsínquia. Cada cliente tem uma história diferente, cada condutor age de maneira, trazendo-nos diferentes emoções - seja o riso, a surpresa ou a comoção. 

Uma das coisas que tenho de gabar é o facto de, em cada uma das cidades, os protagonistas falarem a sua própria língua, provando, desde logo, tratar-se de um bom filme, um filme pensado, e não uma porcaria comercial das que passam na televisão. Aqui não há o típico actor americano a fazer de italiano e a falar inglês, como se essa língua fosse realmente universal. Não. Aqui há actores franceses a fazer de franceses, italianos a fazer de italiano. 

Também a banda sonora é deliciosa, uma música que vai seguindo ao longo dos episódios, dando-lhe estabilidade e coerência, e, talvez, ajudando a relembrar que se trata do mesmo momento em todos eles.

Por fim, tratando-se de um filme de 1991, há imensos pormenores engraçados que nos remetem para esse tempo - os telemóveis gigantes, com antenas, e o próprio facto de se fazerem grandes viagens de taxi, que hoje em dia, com a subida do preço do gasóleo, nem viagens de cinco minutos faríamos! 

Night on Earth. Vale bem a pena.

17 outubro, 2010

Escolhas

A faca percorreu o abdómen, abrindo uma fossa por onde correu um rio vermelho. Os dentes cerrados, uma tentativa de não gritar, rangeram de tal maneira que se diria que alguém acabara de passar com um giz num quadro de lousa. A anestesia não estava a fazer efeito… Não servira de nada, portanto, espetar aquela agulha de dez centímetros mesmo no meio da barriga, sem saber muito bem o que fazia. Não importava. Com ou sem dor, tinha de terminar o trabalho.

Com uma mão, puxou a pele aberta, e meteu a outra por si adentro. Tinha visto um livro de anatomia, e sabia que estava por ali algures. Por fim, lá sentiu um órgão, e começou a puxar. A dor era maior do que se podia imaginar. Vinha de dentro para fora, de algum sítio que ele nunca tinha percebido anteriormente que existia, vinha em massas de pressão, de mal-estar, fazendo brotar nuvens de sangue para o exterior. “Mais um pouco, pensou, só mais um pouco” e agarrou a faca de novo, para cortar o rim de uma vez por todas. Era só um rim, um minúsculo e inútil rim. Porque raio tinha de parecer que o mundo estava a desabar sobre ele, desfazendo-o em mil pedaços?

Por muito que quisesse parar, sabia que não podia. Já estava tudo a postos – a arca frigorífica, o telefonema para a pessoa que ia levar o órgão para o outro lado do mundo, e a menina, que já vinha a caminho. E no entanto, sentia que quase não tinha força para os receber. Não sentia mais nada a não ser aquela zona do corpo, que mesmo assim parecia propagar-se e espalhar-se por toda a sala, como uma bola latejante que exigia toda a atenção para si mesma. Só conseguia ver a faca reluzente nas suas mãos, o rim a sair pela abertura. Sabia que estava a gritar, pois sentia um ardor no fundo da garganta, mas não conseguia ouvir-se, assim como não conseguia sentir mais nenhum cheiro para além do cheiro a sangue, que fazia a sua bílis subir até à boca, que, sem saber como, voltava a enviar de volta lá para dentro. Hoje, só saía o rim.

E que felicidade sentiu quando conseguiu pegar nele e enfiá-lo entre o gelo! De repente percebeu o que a sua mãe queria dizer, quando insinuava que as dores do parto acabavam sempre por ser recompensadas no momento em que pegávamos com as nossas próprias mãos naquela coisinha que saíra de dentro de nós.

Sim. Já não faltava muito para ela vir. Sabia que ia morrer a seguir, esvair-se em sangue… mas pelo menos estaria com ela, e se estivesse com ela estaria bem, esqueceria toda a dor e sofrimento dos últimos minutos. Dera tudo por ela – vendera tudo o que em casa podia ser vendido, desde as jóias até a coisas básicas como móveis, e roupa. Quando não lhe restava nada, vendeu um rim.

As pessoas podiam criticar, e muitas tinham criticado, durante tempo demais. Para ele, não passava de uma questão de escolhas. Muitos gostavam de ir ao ginásio, emagrecer e parecer heróis. Ele, encontrara a sua heroína, e quanto mais pesada, melhor.

04 outubro, 2010

Para o bem da humanidade....


 

Algumas pessoas deviam submeter-se a isto. 
Obrigada.